“Ponte sobre o rio que banha Rio Onor”
(Foto do espólio da C.M. Bragança) Uma estrada para um Vinhais desertificado ou desrespeito humano?*
Este pedaço de estrada até Vinhais é curva e mais curva, num carrossel que nos obriga a estar tentos e não ter pressa. Aldeia após aldeia, vou-me apercebendo da precariedade da vida por estes sítios. E admiramo-nos que a desertificação das regiões interiores seja galopante!
Quem aqui vive não se pode dar ao luxo de ter um doença súbita que exija cuidados médicos urgentes. Uma grávida dará certamente à luz o rebento pelo caminho.
Qual não será a angústia dos pais se tiverem uma criança doente ou vítima de acidente? Isto é longe do mínimo cuidado imprescindível. Dou razão ao meu filho mais velho, quando insiste em me dizer que o computador pode salvar vidas e é mais útil do que aquilo para que muita gente o usa. Realmente, se nestas terras com acessos difíceis as Juntas de Freguesias estivessem equipadas com computadores ligados aos serviços de urgência de um grande hospital, em caso de emergência, poder-se-ia actuar mais rapidamente. Mas para esta solução funcionar era exigível que existisse um médico ou paramédico e uma pequena estrutura funcional que pudesse providenciar os cuidados urgentes necessários. Damo-nos conta que não há recursos humanos com preparação bastante para uma solução que economizaria vidas humanas, dinheiros, infelicidade e angústia.
Estranho país este que continua a ser maioritariamente paisagem para inglês ver!
Não seria mais pragmático e sustentável criar as condições básicas do que permitir que as nossa cidades vão tendo todas elas as suas Reboleiras e Damaias? E as consequências indesejáveis que o crescimento urbano descontrolado acarreta? Desertifica-se de um lado a terra e cria-se, por outro, a desertificação interior do ser humano!
E não haveríamos de ser um país deprimido?!
Torram-se as matas e florestas do país e cultiva-se sardinheiras nas janelas dos prédios porque as plantas criam a ilusão de qualidade de vida na cidade. E a publicidade imobiliária ainda vinca bem que está a levar a natureza para o coração da cidade!!!
Somos tão amigos dos animais que até temos boutiques com roupa para o melhor amigo do homem! E devastamos o habitat dos esquilos, coelhos, perdizes, javalis, lobos, linces, pombos e sei lá que outros! Nós, os animais racionais somos os mais idiotas da criação! A água está poluída. O ar poluído está. A terra desprezada. E nós todos acumuladinhos a ouvir o autoclismo do vizinho a disparar num qualquer dos muitos apartamentos do prédio que habitamos. Sociedade evoluída a nossa! Será o stress uma condição de vida moderna ou será o reflexo da nossa falta de inteligência, da nossa insanidade social?
(…) Os cataclismos mais não são do que a Natureza a assinalar que está saturada, invadida, e, quando assim é, ela expurga-se , elimina os mais fracos e deixa os sobreviventes aprender de novo, desbravar uma nova vida, indiferente às dores , às perdas e aos desgostos de cada um. Quem a respeita? O respeito tem de ser recíproco. Como exigir o que não se dá? Quem pode pedir a devolução do que não entregou?
*Fátima Pinto Ferreira*
*(escritora portuguesa; extracto do livro “São Judas Iscariote” edições Cosmos, 2006)